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Mostrando postagens de junho, 2017

Crônica - E se?

Qual o sentido de uma tragédia? Quem nunca teve essa pergunta martelando a cabeça após ver uma desgraça estampada na capa de um jornal? Encontrar uma razão maior para o fim da vida traz o conforto de imaginar que todo o sofrimento foi necessário para transformar a realidade daqueles ainda fincados neste plano. Mais uma vez isso ocorreu comigo na última semana. A destruição. Veículos espalhados, em pedaços, na rodovia e no matagal ao lado. O fogo. Pessoas gritando por socorro. Gritando pela própria vida. Gritando pela vida dos entes queridos e dos desconhecidos consumidos nas chamas. As histórias de sofrimento do dia seguinte... Pra quê? Em casos assim, somos quase empurrados pelo cérebro a imaginar como seria a realidade, na hipótese disso não ter ocorrido. E se? E se o ônibus atrasasse 5 segundos? E se adiantasse 5 segundos? E se o caminhão parasse em um posto por mais uns instantes? E se o motorista do ônibus perdesse apenas mais um sinal verde? E se o pn

Crônica - Tatuados Estamos Todos

“Aquele dentre vós que estiver sem pecado, que atire a primeira pedra.” (Jo 8 : 7) A agulha correu nervosa pela testa do jovem, desenhando a vergonha do pecado e tornando pública sua fraqueza. A tinta misturou-se às gotas de sangue, rabiscando o escárnio merecido e guardado somente para aqueles que deveriam manter-se à margem de todos. São pragas e como tal devem ser identificadas e tratadas. A sanha de vingança consumia o carrasco que tudo fazia com o prazer doentio garantido aos cansados de presenciarem o mal reinar. Se a batalha parece perdida e salvador algum aparecerá, pelo menos os mortais se insurgem e combatem o possível, com as próprias mãos. O párea suplicava e chorava com a voz emplastada pela saliva grossa. As palavras desconexas faziam brotar um riso forçado na boca trêmula do carrasco. Não havia graça na cena, mas ele assim o fazia parecer, passaria um ar nefasto, faria o medo emergir ainda mais forte no coração do desgraçado. A lição jamais seria esquecida.

Crônica - Ficção e Realidade

Outra criança morreu. Tinha 2 anos e seu nome era Fabiane. O assassino, seu padrasto, antes de lhe arrancar a vida, a torturou e estuprou. Por uma coincidência macabra, o crime ocorreu no dia 18 de maio, reservado para nos lembrar da bestialidade humana; da nossa capacidade de explorar crianças sexualmente. Soube da morte da infante, porém, somente após a prisão do carrasco. Em mais uma brincadeira do destino, o padrasto foi pego ao tentar se esconder numa caçamba, em meio ao lixo, aos restos. Em paralelo, uma notícia chamou a atenção de muitos. Um livro distribuído nas escolas pelo MEC para crianças de 6 a 8 anos possuía um conto no qual um pai, arrebatado por uma paixão doentia pela filha, a pede em casamento e, ante a recusa, aplica-lhe uma punição: prisão nas torres do castelo. Caso a mãe ou as duas outras filhas a ajudassem de alguma forma, morreriam.  Muitos discordaram do governo. O livro estaria fomentando a pedofilia. Um livro tem esse poder? Poderia ele forma

Crônica - Invisíveis

Era porteiro de um luxuoso edifício. Em seu turno de 12 horas, permanecia enclausurado numa cabine de vidros blindados e película espessa. Ninguém o via. Os três monitores à frente lhe mostravam tudo o que fosse possível captar pelas câmeras de segurança distribuídas pelo térreo. Por elas sabia que o Dr. Sidney, renomado cardiologista, saía pontualmente às 07h15min. De igual forma britânica, às 07h30min, o amante da Sra. Costa, esposa do Dr. Sidney, adentrava no prédio com roupa de ginástica. Assistia à Margô, empregada dos Horst, descer com o herdeiro do casal para o play e ficar, por mais de uma hora, chafurdando no celular enquanto o menino comia terra. Observou um par de vezes a Amanda, do 420, adolescente recatada, sendo devidamente amassada pelo namorado nos cantos do corredor, próximo à porta corta-fogo. Os pais evangélicos não gostariam de saber disso. Gostariam menos ainda de saber que ela, no decorrer dos amassos, encarava lasciva a câmera de segurança. Acompanha